Acho que nada é capaz de ferir tanto o ser humano quanto o amor, em suas diversas manifestações. Não há dor física, não há doença que se compare ao que sentimos com a mágoa do amor, ou a perda. E isso sem mencionar casos extremos, como a mãe que perde um filho, por exemplo. Não há tempo que cure esta ferida, a cicatriz sempre ficará aberta. Mas não estou falando desse tipo de amor, incondicional, estou falando de amores mais simples (?). Amores que escolhemos sentir. Pessoas que escolhemos deixar entrar em nossas vidas.
Muitos podem discordar de mim na questão da escolha, mas o fato é que ela existe. Todas as pessoas que fazem parte da nossa vida, ali estão por algum motivo. Em algum momento, ainda que inconscientemente, tomamos a decisão de confiar ou não em alguém, de gostar de uma pessoa de um jeito ou de outro, e essa decisão é baseada nos valores pessoais de cada um.
É importante entendermos essas esoclhas, porque várias vezes nos perguntamos qual é o motivo de gostarmos tanto de alguém que nos faz tão mal. E como eu disse, dor de amor é uma coisa única, completamente devastadora. É capaz de nos deixar tão desnorteados a ponto de nos esquecermos até de nossa essência. E é quando isso acontece que nos esquecemos até do motivo do amor, só nos lembramos da mágoa. Isso se torna um vício tão grande, que cada vez mais nos afundamos em nossa própria dor, incapazes de ver outra saída.
Mas aí alguém pode perguntar: qual a vantagem de lembrar o que alguém nos fez de bom, se aquilo só nos vai trazer mais saudades e, consequentemente, mais dor?
Eu digo que não é um raciocínio simples de se entender. Mas a verdade é a seguinte: antes de esquecer um amor, é necessário compreendê-lo dentro de si mesmo. Não, não é algo fácil de fazer. Na maioria das vezes já chegamos num ponto onde nosso amor já se tornou completamente platônico, e nós nem percebemos. Prosseguimos amando a idéia que temos daquela pessoa. Na verdade, se estamos já há muito tempo vivendo um processo de rejeição por parte da mesma, somos capazes de passar um imenso tempo nos culpando e nos denegrindo, em prol da manutenção da boa imagem de santo da pessoa amada em nossa cabeça, sendo que acabamos ficando completamente cegos aos fatos. Não somos capazes de ver que aquela pessoa que tanto nos encantou e conquistou no passado provavelmente não existe mais. Não existe, porque já deve ter passado por tantas coisas, tantas experiências e tantas mudanças, que se pudéssemos ter uma conversa franca com ela, perceberíamos que ela se tornou uma completa estranha para nós.
Ahhh, mas é claro que isso não é facilmente assimilado por nós... é um longo caminho até que possamos enxergar novamente a realidade pura dos fatos. Um caminho longo e penoso, aliás, mesmo que às vezes a realidade esteja bem debaixo do nosso nariz. Mas eventualmente acaba acontecendo, geralmente no momento em que já sofremos tanto, mas tanto, que nosso cérebro já não é capaz de processar mais dor. Ficamos entorpecidos. Como se não pudéssemos sentir mais absolutamente nada, por ninguém.
E é somente quando nosso lado emocional chega ao limite da exaustão que o lado racional entra em cena, analisando e apreendendo os fatos. Normalmente, quando isso acontece, nossa primeira reação é sentirmos raiva de nós mesmos. Raiva porque nesse momento só enxergamos a realidade presente, e o presente é um oceano de mágoa e rancor. Aqueles mesmos motivos que nos fizeram tanto amar aquela pessoa, permanecem esquecidos. Tudo o que conseguimos pensar é no quanto fomos idiotas, por termos gastado tanta energia e dedicado tanto de nosso tempo a um sentimento completamente inútil.
Mas como tudo, a raiva também passa. É aí que começamos e compreender o sentido de tudo. Através das lembranças, somadas à compreensão de nossas escolhas e dos fatos como eles realmente aconteceram, sem estarem distorcidos por nossa dor, podemos deixar o amor ir embora. Sem mágoa, sem dor. Entendemos que aquela pessoa é agora parte do passado e que, apesar de tudo, ela nos proporcionou bons momentos, que nós provavelmente nunca iremos esquecer. E que esses momentos valeram a pena. A saudade se torna algo saudável, como aquela saudade que sentimos da infância por exemplo. Ou seja: saudade de algo que entendemos que não pode voltar, e no fundo nem desejamos verdadeiramente que volte.
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Eu comecei esse texto pensando apenas em amor não-correspondido, acabei chegando ao processo de recuperação de um coração em ruínas. Se escrevi tudo isso, é porque eu vivi isso. Senti essa dor na pele, sei o quão fundo o poço é.
Hoje, desprendida, vejo o amor com outros olhos. Acredito nele novamente. Não tenho medo da mágoa, ela já não é uma estranha pra mim. Não acho que conseguirei amar novamente dessa mesma maneira doentia.
Ainda assim, me sinto grata por tudo o que vivi. Tenho carinho por aquele que tanto amei um dia, ainda que esta pessoa não faça mais parte da minha vida (e como eu disse, eu nem desejo que volte a fazer). Não acho que amores possam ser esquecidos, mas podem ser superados. Porque é com essa superação que voltamos a ser plenamente felizes, conscientes de nós mesmos e de tudo aquilo que verdadeiramente importa para nós.
E é essa felicidade plena que desejo, de coração, a todos aqueles que souberem a dor de um amor verdadeiro, quando não-correspondido ou perdido, por qualquer motivo que seja. Não importa se amor de amigo, namorado, irmão, etc. Cada um dói de um jeito, e cada um é capaz de nos destruir. Não sei qual é pior. Mas uma coisa eu posso dizer: um dia acaba.
Excelente texto, de fato, para descrever tão bem o caminho, tem que estar voltando de lá. Esse tipo de texto é ótimo para quem precisa saber, se resguardar, ter noção de como é o amor. Cada um tem um modo diferente de amar, cada um tem uma dor diferente e apesar de mais doentia e dolorosa que seja uma separação, ela só é facilitada se a outra pessoa lhe dá motivos para isso. Caso contrário se prepare, rs.
ResponderExcluirOlá (:
ResponderExcluirDe tanto me identificar (não só com suas palavras, mas até com a forma descrita, tão familiar), eu me emocionei.
Você conseguiu descrever o que estava rondando minha cabeça, já faz um tempo.
Parabéns, pelo texto e principalmente, pela sua superação equilibrada.